Modas à (na) Mesa

 

 

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A cozinha foi, desde sempre, uma atividade dinâmica e em processo continuado de aperfeiçoamento e inovação. Por isso, algumas vezes, tentamos entender, no tempo, a forma como a cozinha atual chegou até nós. Da cozinha primitiva, ainda sem utensílios próprios, passando pelas variadas fontes de energia, até à atual maquinaria disponível, passaram-se séculos de um processo lento até chegar ao século XX. Depois do aparecimento do fogo inicia-se um modo de convívio fundamental com as refeições em grupo, sentados à volta da fogueira. O alimento é assim “muito mais do que uma necessidade vital. É também uma fonte de prazer, o fundamento da linguagem, uma dimensão social do erotismo, uma atividade económica importante, um ambiente de trocas, um elemento-chave da organização das sociedades. Ele estabelece as nossas relações com outras pessoas, com a natureza e com os animais. É a mais perfeita medida da estranheza da nossa condição e da natureza das relações entre os sexos”; eis a dimensão invulgar que Jacques Attali lhe atribui no seu livro Histoires de l’alimentaion, 2019.

Uma refeição é, pois, muito mais do que o ato necessário de alimentação e, no século XX, assistimos ao crescendo na atitude de tomar refeições fora de casa; e agora muitos dos que comem em casa consomem refeições confecionadas no exterior e desenvolve-se uma nova atividade de transportadores que não se lembram de que há regras de trânsito. Até estranho não haver mais acidentes…

Nesta crónica não utilizarei fotografias pois o objetivo não é identificar os locais, e muitas vezes as fotos denunciam o estabelecimento. O sentido é identificar situações que não devem ser multiplicadas.

Já anteriormente assinalei a moda de utilização excessiva de vinagre balsâmico e, infelizmente, com cópias do autêntico. A forma mais comum, e disseram-me que era uma questão de estética e de moda, eram os pingos de balsâmico na taça onde deveria existir apenas o azeite. Quem quer molhar o pão para apreciar o azeite corre o risco de levar um toque adocicado. Felizmente esta moda está a cair em desuso. Também decorar os pratos com riscos de balsâmico quer seja peixe quer seja carne, grelhados, e em muitas outras formas de confeção tem sido uma prática. Não se deve exagerar ou generalizar a utilização deste vinagre tão delicado que não é acompanhamento recomendado para tudo!

As modas só existem porque os consumidores as alimentam. Possivelmente provaram, gostaram e continuaram. Outros, talvez menos, consomem só porque estão na moda! Não sou muito de modas. Uma recente e com muitos aderentes tem a ver com o fogo. Neste capítulo convém separar o fogo com lenha que cozinha os alimentos em recipientes próprios, e os alimentos que recebem a labareda do fogo e ficam em contacto com o fogo. Costumo dizer, em tom de brincadeira, que os nossos antepassados demoraram tantos séculos para garantir que os alimentos não tocassem no fogo, que vamos agora, no que parece um retrocesso civilizacional, voltar a deixar os alimentos “chamuscados” …! Há poucos meses fui convidado para um restaurante com o programa e conceito de cozinhar no fogo. Só quando me sentei à mesa percebi onde estava. Delicadamente fui cortando a comida em estiletes para não comer queimado. Reparo que o meu anfitrião estava em maior luta que a minha e ambos declarámos que não foi uma escolha brilhante. Por sugestão de quem me convidou, deixámos os pratos a meio, e fomos para o restaurante mais próximo vingarmo-nos em sobremesas feitas de forma tradicional. E eu que fui educado a comer alheiras assadas sobre grelhas à lareira; calor intenso, mas sem labaredas. Já que estamos nas “labaredas” mais uma vez me manifesto sem interesse por pratos finalizados com maçarico. Em Lisboa muitas vezes escolho restaurantes que sei não terem maçaricos, ou quando têm aviso que prefiro, especialmente o peixe, cru do que com sabor o queimado. Basta ver o meu Instagram…

 

 

 

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Outra moda florescente é a da “carne maturada”. Eu era criança e o meu avô materno já maturava carne como método de conservação. Na sua cozinha havia umas facas especiais que limpavam a carne de toda a gordura. Quando me acontece “ter” que comer carne maturada, sabe-me sempre a ranço… Não tenho nada contra aqueles que gostam. Mas não me acusem por eu não gostar, quer dizer, não apreciar.

A música ao vivo (ou Dj’s de serviço) pode ser um prazer, mas também pode destruir uma boa refeição. Aquele conceito de convívio, e uma refeição para conversar, se o volume do som é alto, e teremos que gritar, melhor é não ficar. Já me aconteceu mudar de restaurante pelo som muito elevado. Pior, e no ano passado, aconteceu-me duas vezes entrar no restaurante e os músicos a ensaiar. Depois de o restaurante abrir nada de ensaios, pois é das sensações mais desagradáveis quando se espera por um prazer!

Lamentável também é o comportamento dos clientes que não respeitam a hora da reserva e, mais grave, quando reservam, faltam e não avisam.

BOM ANO 2022, e saibam que os restaurantes são locais saudáveis.

© Virgílio Nogueiro Gomes

 

 

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