Ervilhas

 

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Bolinhas verdes que encantam muitos e incomodam outros tantos! Depois também em vagem, ervilhas de quebrar ou ervilhas tortas, que fazem as delícias daqueles que as apreciam quando começam a aparecer em primavera tardia como que a anunciar o verão.

Há referências muito antigas da existência da ervilha. Parece poder remontar a 7000 a 6000 anos a. C. o que parece poder dizer-se que esta leguminosa um dos produtos cultivados mais antigos da história da humanidade. A par das lentilhas, grãos-de-bico, trigo e cevada parecem ter a usa origem no médio oriente. Muito citadas no Egipto poderão ter sido trazidas pelos romanos para a Europa. Clássicos autores gregos e latinos como Teofrasto, Plínio o Velho e Columela lhes fazem referência nas suas obras. Teofrasto (c. 371-286 a. C.), para além da ervilha, cita termos associados como ervilhaca, ervilha-dos-campos, ervilhaca-subterrânea e ervilheira. Ervilha e Ervilheira, neste autor tem o correspondente nome latino de Pisum Sativum L. Segundo Évelyne Bloch-Dano, o termo grego pisos deu origem ao termo latino pisum que terá originado o termo francês pois. A apelação científica recuperou o termo pisum e adicionou sativum. José Pedro Machado, no Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa, 2003, atribui a origem do termo ervilha deriva do latim ervília, «pequena lentilha»; é diminutivo de ervum, «lentilha, pequena leguminosa». Da Roma Imperial, no De re coquinaria encontramos umas quinze receitas! Até à Idade Média seria conservadas secas, como as favas, e depois hidratadas. A moda das ervilhas frescas parece iniciar-se a partir do século XVI.

 

 

 

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Em Portugal encontramos a referência a ervilhas no Auto Chamado dos Físicos, da autoria de Gil Vicente (1465-1536). Na época medieval encontramos várias citações, de Iria Gonçalves, que confirmam a sua presença. Num manuscrito do século XVII, e trabalhado por Anabela Ramos e Sara Claro, publicado sob o título “Alimentar o Carpo Saciar a Alma”, 2013, apresentam uma receita de “Ervilhas Secas e Verde”. Ervilhas também aparecem no receituário de Domingos Rodrigues no seu livro Arte de Cozinha (1680) particularmente para carnes como carneiro com couve murciana, ou com qualquer outra hortaliça. Chegamos finais do século XVIII e, a propósito do excesso de temperos da comida, é William Beckford que escreveu... uma colher de ervilhas ou um quarto de cebola é suficiente para nos pôr a boca a arder (tradução de Maria Laura Bettencourt Dias), registo no seu diário de 27 de junho de 1787 no jantar em casa do Marquês de Marialva.

 

 

 

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É fácil encontrar várias receitas a partir do século XIX e algumas que se fixaram no receituário regional português. Mas é no começo do século XXI, 2003, que encontrei o texto mais fascinante sobre ervilha. No “Dictionnaire amoureux de la cuisine”, Alain Ducasse escreveu: A ervilha é uma autêntica joia. Um berlinde pequeno de cor verde acetinado, que se adivinha crocante. Um sabor inimitável. Uma delícia absoluta. A sua temporada é muito curta, e as suas exigências são principescas. O grande chefe descreve ainda algumas formas de cozinhar.

A ervilha é rica em vitaminas A, B, C e PP. No mercado aparecem habitualmente congeladas ou em conserva. Pessoalmente prefiro as congeladas que se mantém mais verdes e mais crocantes e conservam as vitaminas. Parece reconhecido como melhor forma de as cozinha ser cozidas a vapor, e depois regadas com azeite e umas gotas de sumo de limão. Também quando se cozem em água, guardam a sua cor verde se a panela estiver destapada. Já a ervilha de quebrar, que se come completa, é rica em vitamina que se mantém em cozedura a vapor.

 

 

 

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Em Espanha é fácil encontrar ervilhas desde a famosa paella a muitos outros pratos. Em castelhano o seu nome é guisante talvez por ser a forma mais tradicional de as cozinhar: guisadas. Também em Portugal, as ervilhas são guisadas com carnes e enchido e com ovo escalfado. Esta é, possivelmente, a forma mais comum de as encontrar confecionadas.

O século XX começa bem com receituários. Carlos Bento da Maia, no livro Tratado Completo de Cozinha e Copa, 1904, no capítulo de Algumas palavras acerca dos alimentos, e para ervilha escreveu: Dividem-se as numerosas variedades de ervilhas em dois grupos muito distintos, a saber: 1º Ervilhas de grão. 2º Ervilhas de casca, ervilhas de quebrar ou come-lhe tudo. As ervilhas comem-se verdes, com ou sem vagem, sós ou associadas a diversos legumes e carnes. As ervilhas secas são consideras, por alguns, preferíveis aos feijões como de mais fácil digestão e menos flatulentas, mas é preciso desembaraçá-las das películas. Sugere nove receitas específicas para ervilhas e estas entram ainda em várias outras receitas especialmente com carnes.

Depois, Olleboma, no livro Culinária Portuguesa, 1936, apresenta uma receita de Ervilhas Guisadas à Portuguesa, e ainda Arroz e Ervilhas em Pudim à Alentejana, Dobrada à Jardineira e outras com ervilhas. Já Maria Odete Cortes Valente, no livro Cozinha Regional Portuguesa, 1973, sugere várias receitas, designadamente: Ervilhas do Alentejo, Ervilhas à Algarvia, Ervilhas co Ovos Escalfados, Ervilhas Tortas Guisadas da Beira Baixa e Sopa de Ervilhas Tortas da Beira, Pescada com Ervilhas, Frango com Ervilhas à Portuguesa e Vitela com Ervilhas. Maria de Lourdes Modesto, no livro Cozinha Tradicional Portuguesa, 1982, apresenta receitas específicas de: Ervilha de Quebrar (Trás-os-Montes e Alto Douro), Ervilhas de Cavaca (Beira Baixa), Ervilhas à Moda do Algarve, Ervilhas com Ovos Escalfados (Estremadura) e Ervilhoto Guisado (Trás-os-Montes e Alto Douro). No seu livro Cozinhar com Vegetais, 2005, apresenta duas receitas para ervilhas e duas receitas para ervilha de quebrar, contemporâneas e de inspiração exterior.

© Virgílio Nogueiro Gomes

 

 

 

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