De volta à Escola!

 

Terminou hoje, 23 de maio de 2018, o II Encontro de Estudos Superiores em Gastronomia, em Coimbra. O evento contou com a participação da Universidade de Coimbra, Instituto Politécnico de Coimbra e a Escola de hotelaria e Turismo de Coimbra. De entre as várias atividades do programa constava um Jantar dos Gastrónomos que foi servido na Escola de Hotelaria e Turismo de Coimbra da qual guardo, sempre, boas recordações. Este jantar que também apelidaram de back to school e que acabou por dar título, em português, a este relato. Entendi bem a emoção e prazer no regresso dos antigos alunos à escola pois a mim também aconteceu voltar às duas escolas onde fiz formação para hotelaria para participar em atividades no decorrer do meu percurso profissional. Responderam à chamada quatro chefes de prestígio para confecionarem a refeição, com as equipas de formação da escola. E como se disse, a vários níveis, se está sempre a aprender e os locais de trabalho continuam a ser, sempre, locais de aprendizagem.

O jantar correu muito bem e vou apresentar as iguarias identificadas com os seus autores:

 

 

 

0ehtc1

O seixo do rio Mondego

Chef Vitor dias, Hotel Quinta das Lágrimas

 

 

 

0ehtc2

O ovo a baixa temperatura com creme de queijo Rabaçal e espargos verdes

Chef Vitor dias, Hotel Quinta das Lágrimas

 

 

 

0ehtc3

Da Islândia, o bacalhau

Chef Diogo Rocha, Restaurante Mesa de Lemos

 

 

 

0ehtc4

Leitão

Jalapeño / Coentros / Chili

Chef Ricardo Costa, The Yeatman Hotel

 

 

 

0ehtc5

Profiterole Tropical

Chef Gabriel Campino, Hotel Tivoli Avenida

 

 

 

0ehtc6

Laranja do Mondego

Chef Gabriel Campino, Hotel Tivoli Avenida

Foi também um jantar de festa, e uma homenagem à qualidade de formação desta Escola.

 

 

 

0ehtc7

Os Chefs, ex-alunos da Escola de Hotelaria e Turismo de Coimbra: Gabriel Campino, Diogo Rocha, Ricardo Costa e Vitor Dias

 

© Virgílio Nogueiro Gomes

 

Pastéis de Vimioso

 

 

 

0amvim0 

É infindável o inventário da doçaria portuguesa, da popular à conventual, e acrescida de novas criações que, devagar, vão entrando no nosso consumo e depois passarão também a ser uma tradição. Quantos anos são necessários para uma receita nova ser considerada tradição? Trinta, quarenta, cinquenta? Imprevisível! Já assisti a modas e depois desaparecerem...

A minha amiga Cristina Castro continua com a aventura elogiável de fazer o inventário da nossa doçaria, num projeto que podemos sempre assistir em noponto.pt ou nos livros já editados que comtemplam a região do Norte, e a do Sul. Esperamos que o da região Centro saia ainda este ano, e depois o volume para as ilhas da Madeira e dos Açores.

 

 

 

0amvim1

É um lugar comum, e nem sempre com as respostas mais certas ou sérias, quando se fala de um doce bom e requintado associá-lo à classificação de conventual. Tantos disparates a que tenho assistido. Não era só nos conventos que se fazia doçaria rica ou delicada! Dizem que o nome “conventual” faz vender mais... Quando o doce é bom não precisa de apelidos. E, independentemente de se integrar numa matriz culinária comum da doçaria conventual, só se deve chamar conventual quando temos a sua origem confirmada documentalmente ou a transmissão oral confirmada por gerações que fizeram chegar o doce até nós. Sempre que me apresentam um doce conventual que não conheço pergunto sempre: de que convento? Não é só a doçaria conventual que pode ser requintada e rica.

 

 

 

0amvim2

Tanta conversa para chegar aos Pastéis de Vimioso, que também se conhecem como Pastéis de Amêndoa de Vimioso, e parece que nos inícios do século XX se chamariam de Lamego! Recentemente estive na Feira das Cantarinhas de Bragança e, na Praça Camões, encontrei um posto de venda de “Pastel d’ Amêndoa D.a Antoninha”. Achei que os pastéis eram idênticos a outros de Vimioso que já tinha comido em outras ocasiões. Estes muito bem-apresentados, embalagem cuidada e a única diferença visível é a forma como a amêndoa da cobertura se encontra cortada, diria que é laminada. Em outros pastéis a amêndoa encontrava-se em pequenos palitos. Para mim, o elitismo deste pastel é a qualidade, espessura, da massa externa. Tão fina que quebra sem esforço à primeira dentada. Há quem diga que esta massa é um dos segredos das doceiras de Vimioso. Na realidade não se trata bem de uma massa, mas uma forma de forrar as formas com farinha e salpicos de água com várias repetições que, quando vão ao forno, solidificam como se de uma massa se tratasse. O recheio é um creme feito a partir de um ponto médio de açúcar, gemas de ovo e amêndoa. Mas o meu objetivo não é dar a receita. Vão comprar os que já são bem confecionados.

 

 

 

0amvim3

Nesse dia liguei para a minha amiga Isabel Escudeiro que confirma as artes da sua Mãe a fazer estes pastéis e que, de facto, naquele tempo de chamavam de Lamego. Na Feira das Cantarinhas falei com Edite Domingues que me explicou que a receita está também na sua família e que se conhece a sua confeção desde 1918 data em que a famosa D.a Antoninha a terá trazido de Lamego. Fui tentar ver as heranças do Mosteiro das Chagas de Lamego, livro de José Sidónio Meneses da Silva, e não encontrei nenhum pastel idêntico. Por isso o meu texto inicial que não era só nos conventos que se adoçava a boca com requinte. As famílias abastadas das proximidades do Douro tinham muitos atributos de alto cozinha, e doçaria.

Sei que se vendem, pelo menos, em 3 locais em Vimioso:

Rosita – Rua Dr Sá Carneiro, 4

Café-Pizzaria Pires – Largo Mendes Rufino, 20

D.a Antoninha – Praça Eduardo Coelho, 9

Possivelmente haverá mais.

Vão a Vimioso por muitas razões, e agora também por este doce.

Bom Apetite!

© Virgílio Nogueiro Gomes

 

 

 

0amvim4

As fotos agora publicadas são todas de D.a Antoninha

 

Feira das Cantarinhas

 

0cant1

 

Estive recentemente em Bragança e pude assistir à grande animação na cidade pois realizou-se a Feira das Cantarinhas cuja tradição a colocava a 3 de maio, também dia das Festas das Cruzes em Barcelos. A Feira das Cantarinhas passou a realizar-se, este ano pela primeira vez, no primeiro fim de semana de maio. Antigamente esta feira anunciava a primavera plena e a grande novidade eram as cerejas. Mas este ano, o clima pregou-nos a partida e ainda não havia cerejas! Com grande pena minha. Mas ainda encontrei cantarinhas das antigas e, pelo menos, uma artesã aí se apresentava com grande sucesso. Há muitos anos os produtos principais eram as cantarinhas artesanais, de produção local e umas cantarinhas mais aperfeiçoadas, e os famosos “pretinhos” para dar sorte. E sorte tive eu pois adquiri o último pretinho artesanal.

 

 

0cant4

O famoso "pretinho" para dar sorte

 

 

 

0cant3

Cantarinhas artesanais e tradicionais

 

Mas esta feira já tem pouco a ver com as feiras da minha meninice. Havia na verdade outros produtos que vinham das regiões próximas e estes produtos eram o grande atrativo que vem de herança das feiras medievais. Basta ler os vários estudos de virgínia Rau e Iria Gonçalves para perceber a função das feiras daqueles tempos e como chegaram até nós. Em Bragança temos notícia da primeira feira em 1272 pois D. Afonso III lhe deu carta de feira anual e que deveria começar a 16 de julho e continuar por quinze dias completos. Com D. Fernando, em 1383, a feira passou a ser de trinta dias, confirmada depois por D. João I, com trinta dias, com tanto que se fizesse em tempo que não faça prejuízo às outras feiras que se fazem darredor na comarca. Outras feiras e com outras formulações continuaram a acontecer nesta região e, de facto, as feiras contribuíam para a chegada de produtos novos a esta cidade. Alguns produtos raros e caros como o foram o açúcar, a canela e a erva doce.

 

 

 

0cant8

Pastéis de Vimioso

Não havia cerejas, o meu alvo ansiado, mas encontrei o centro da cidade bem preenchido com a Praça Camões que concentrava o artesanato, onde se incluíam felizmente alguns alimentos e em destaque os Pastéis de Vimioso, e o palco de animação musical. A Praça da Sé cheia, o início da rua dos Combatentes da Grande Guerra, a rua Almirante Reis em festa, a avenida João da Cruz (sentido sul/norte) com vendas, e ainda as ruas da República e Alexandre Herculano também com vendas. Há muitos anos que não via o centro da cidade tão animado, e só por isso fiquei contente. Curiosamente, no início da avenida João da Cruz havia uma instalação artística com “interpretações” de cantarinhas de grandes dimensões.

 

 

 

0cant2

Na comida havia representação da doçaria local com “económicos”, “súplicas” e “dormidos”. Depois havia apresentação de doçaria de outras regiões e até apresentação de pastelaria a que chamamos de “fabrico próprio”. Alguns produtos hortícolas alguns para plantio. Por mim vinguei-me a comer do bom pão e chouriço assado, pedaço de bom “bísaro”, rodeão e umas ervilhas tortas deliciosas, tudo do melhor no restaurante D. Roberto em Gimonde. Dispõe de Turismo de Habitação e uma apetitosa loja de produtos regionais, com o melhor dos enchidos que aí se fazem.

 

 

 

0cant5

Tudo de Bísaro

 

0cant6

Bísaro, Rodeão e Ervilhas tortas

Em breve darei mais notícias desta minha estada em Bragança. Até lá aproveitem que a primavera parece ter chegado, finalmente!

© Virgílio Nogueiro Gomes

 

 

Restaurante D. Roberto
Rua Coronel Álvaro Cepeda - Gimonde
5300-553 Bragança

TL 273 302 510

 

 

0cant7

 

G de Pousada

0bgp0

Azulejos de Júlio Resende “Caça e Pesca” a decorar uma das paredes

Não é a primeira vez que escrevo sobre este restaurante e espero que não seja a última. Estive recentemente em Bragança, na Feira das Cantarinhas, e fiz uma das poucas refeições nesta estada, na Pousada de S. Bartolomeu, depois de ganharem pelo terceiro ano consecutivo o Garfo de Ouro do Guia Boa Cama Boa Mesa sobre o qual já dei notícia.

A cozinha e gestão é assegurado por dois jovens, irmãos, Óscar e António, e filhos de um casal do qual herdaram genes de qualidade culinária e hospitaleira. A Pai e a Mãe continuam a operar com outro grande restaurante em Bragança que é o Geadas. Portanto o G pode ser identificador de Geadas, e também de Gonçalves apelido do Pai.

O restaurante é um local confortável e cómodo, e com uma vista deslumbrante sobre a cidade. Para além da comida ser de exceção, revela na sua simplicidade a identificação dos produtos e uma cozinha de cozeduras exatas. E depois sentimos uma mesa de Transmontanices que tanto me agradam. Vinhos transmontanos e um serviço de mesa irrepreensível. O restaurante tem um serviço à lista e também três menus degustação. Há aconselhamento para bom casamento com vinhos. Eu fiz opções ajustadas ao meu paladar ou, melhor, à minha educação do gosto. É um restaurante onde apetece voltar!

Eis o meu jantar:

 

0bgp1

Pão artesanal com azeitonas, manteiga dos Açores

 

 

0bgp2

Batata com tinta de choco, salada de bacalhau com pimentos

 

 

 

0bgp3 

Mil folhas de cenoura e ossobuco

 

 

0bgp4

Cigala, massa fresca de trigo barbela, amanitas ponderosas e cidreira

 

 

0bgp5

Pargo de linha, cantarelos, cuscos de Travanca e ervilhas tortas

 

 

0bgp6

Veado, biscoito de cedro, maçã de Carrazeda de Ansiães, escorcioneira

 

 

 

0bgp7 

Pera escalfada em caldo de limonete e gelado de amêndoa

 

 

 

0bgp8 

Cappuccino de castanha em copo de chocolate e biscoito de castanha e amêndoa

 

 

0bgp9

Vinho Rosé

 

 

0bgp10

Vinho Tinto

 

 

 

0bgp11 

Detalhe da faca de couvert executada pelo artesão Gilberto Ferreira, de Aveleda

Restaurante G
Pousada de Bragança
Estrada de Turismo
5300-271 Bragança

TL 273 331 493

Este endereço de email está protegido contra piratas. Necessita ativar o JavaScript para o visualizar.

 

 

 

0bgp12

 

Nêsperas

 

 

 0nesp1

 

As nêsperas parecem umas frutas mal-amadas dos restaurantes; melhor os clientes parece não as quererem consumir nos restaurantes. Porquê? Pela dificuldade em usar os talheres? Por não as saberem comer com elegância? O melhor talher para as nêsperas são as mãos. Sim, há alimentos que se devem consumir à mão e, conforme a categoria do restaurante, colocam lava mãos na mesa ou, modernamente, fornecem toalhitas refrescantes habitualmente com cheiro de limão. Apesar destas soluções para não criar constrangimentos aos clientes confirma-se uma certa relutância em os restaurantes as incluírem até na “fruta da época”, matéria sobre a qual já escrevi e podem reler clicando aqui. Estamos na época das nêsperas e se as primeiras a aparecerem são de um preço ligeiramente elevado, quando a primavera nos fornece o calor de quase verão, o seu preço é mais convidativo.

 

 

 

0nesp2

 

Segundo José Pedro Machado, Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa, 2003, o termo nêspera aparece apenas no século XVI. Há, no entanto, o termo nespereira que já se encontra escrito em 954, em latim. Alexandre Dumas, no seu Grand dictionnaire de cuisine, 1870, refere-se, curiosamente, a nêsperas como a fruta de S. Lucas porque se colhe na época da sua festividade a 18 de outubro. Depois aconselha a comer cruas ou em doce, dando uma receita de Compota. Também Maria de Lourdes Modesto na Grande Enciclopédia da Cozinha, 1960, sugere que ... só deve ser comida quando bem madura, porque só assim apresenta um sabor doce e agradável e proporciona ao organismo a assimilação dos sais e açúcar que contém... São geralmente frutos de sobremesa e comem-se crus, mas utilizam-se também na preparação de compotas, marmeladas, doces, etc. Apresenta ainda uma receita de Doce de Nêsperas e outra para um Bolo de Nêsperas.

 

 

 

 

0nesp3

 

Outros autores como Maria Lucia Gomensoro ou Claudio Fornari recomendam que a fruta se come fresca, mas madura. Já Marcia Algranti no Pequeno Dicionário da Gula, 2004, informa que as nêsperas fornecem hidratos de carbono, sais minerais, e vitamina A e C, e complexo B ... por sua cor amarelo alaranjada, e seu aspeto de pequenina pera, é de grande efeito decorativo .... É também apreciada em compotas e como doce.

 

 

 

 

0nesp4

 

 

A nespereira é oriunda do oriente e especialmente do Japão. Sabemos que era cultivada na Assíria e na Babilónia e supõe-se que chegou a Inglaterra através dos romanos. Já está representada em mosaicos em Pompeia e tendo chegado à Grécia sete séculos a. C. só há notícias da árvore em Roma 200 a. C. Segundo Gil Felippe, no livro Frutas – Sabor à Primeira Dentada, 2005, també era usada como planta ornamental e obrigatória nos jardins de Carlos Magno (768-841). Pouco se sabe sobre a sua chegada a Portugal. Há quem defenda que os árabes que povoaram parte do território que é hoje Portugal já a teriam plantado. Possivelmente foi trazida do oriente, e depois levada para outros territórios administrados pelos portugueses designadamente para o Brasil sendo comum no estado de S. Paulo, onde também é conhecido o fruto por ameixa-amarela. Os três principais países exportadores são o Japão, Israel e o Brasil.

 

 

 

 

0nesp5

Peladas e prontas para comer

 

Pois aí temos as nêsperas, fruto amarelado, em forma de pera, pelo ligeiramente rígida e ácida, com três a cinco caroços. Como também é rica em pectina é comum fazerem-se ótimas geleias. Quando eram miúdos guardávamos os caroços para brincar e fazer algumas maldades...!

Comam fruta pela vossa saúde. E aproveitem na época naturalmente produzida. Percam a timidez de a pedirem nos restaurantes. As nêsperas das fotos são portuguesas e adquiridas durante este mês de abril de 2018.

© Virgílio Nogueiro Gomes

 

 

0nesp6